sexta-feira, 8 de julho de 2011
AMOR SEM POSSESSÃO
Herculano Pires
O desapego é uma constante nas lições dos grandes mestres espirituais. E mesmo na vida terrena as pessoas sensatas e experientes compreendem os perigos do apego amoroso. Todas as escolas de psicologia denunciam esses perigos e, desde os gregos até nós, os filósofos ensinam que a felicidade depende da nossa capacidade de libertar-nos do apego às coisas e aos seres.
O ciúme é sintoma de apego e leva a desequilíbrios perigosos, podendo gerar doenças graves e acarretar crimes nefandos.
Lemos sempre nos jornais a expressão: “Matou por amor”. Mas a verdade é que o amor não mata, pois o amor é vida e não morte. O que mata é o ciúme, o apego amoroso, gerado por sentimentos inferiores de posse exclusivista da pessoa amada.
Esses sentimentos são resquícios animais da espécie que racionalmente devemos expulsar de nós, ao invés de racionalmente aumentá-los, como em geral fazemos.
Nossa imaginação pode levar os instintos animais a intensidades ameaçadoras, o que jamais ocorre nas espécies animais. Temos de aprender a amar sem apego.
Quando Cornélio escreve que “o amor na totalidade é a natureza de Deus”, lembra-nos a afirmação de João, em seu Evangelho: “Deus é amor”. E Cornélio tira deste princípio a explicação do antigo mistério da presença de Deus em nós, afirmando: “O amor é Deus em nós todos, cada qual tem um pedaço.”
A seguir, adverte que quanto menos possessão puser no amor, mais amor teremos em nosso coração. É impossível dar-se uma lição tão elevada com palavras mais simples e de maneira mais natural.
Toda a dinâmica da evolução espiritual se esclarece na simplicidade caipira desses versos.
Deus está presente em nós pela nossa capacidade de amar, mas enquanto não superarmos o nosso egoísmo, que tudo quer com exclusividade, o amor permanecerá sufocado pela vaidade, o desejo e a ambição.
Poderíamos perguntar: mas se o amor é o próprio Deus, por que ele não vence o nosso apego?
A resposta é clara: porque amor é liberdade.
O amor é Deus chamando-nos para a liberdade, convocando-nos ao desapego por nossa própria compreensão e decisão.
Deus não nos ama com apego, mas com liberdade, e por isso não quer impor-nos a compreensão do amor que devemos atingir por nós mesmos.
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