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segunda-feira, 18 de agosto de 2014

BRINCADEIRA. Começou como uma brincadeira. Telefonou para um conhecido e disse: - Eu sei de tudo. cronicas de luis fernando verissimo


Começou como uma brincadeira. Telefonou para um conhecido e disse:
- Eu sei de tudo.
Depois de um silêncio, o outro disse:
- Como é que você soube?
- Não interessa. Sei de tudo.
- Me faz um favor. Não espalha.
- Vou pensar.
- Por amor de Deus.
- Está bem. Mas olhe lá, hein?

Descobriu que tinha poder sobre as pessoas.
- Sei de tudo.
- Co- como?
- Sei de tudo.
- Tudo o quê?
- Você sabe.
- Mas é impossível. Como é que você descobriu?

A reação das pessoas variava. Algumas perguntavam em seguida:
- Alguém mais sabe?

Outras se tornavam agressivas:
- Está bem, você sabe. E daí?
- Daí nada. Só queria que você soubesse que eu sei.
- Se você contar para alguém, eu…
- Depende de você.
- De mim, como?
- Se você andar na linha, eu não conto.
- Certo.

Uma vez, parecia ter encontrado um inocente.
- Eu sei de tudo.
- Tudo o quê?
- Você sabe.
- Não sei. O que é que você sabe?
- Não se faz de inocente.
- Mas eu realmente não sei.
- Vem com essa.
- Você não sabe de nada.
- Ah, quer dizer que existe alguma coisa pra saber, mas eu é que não sei o que é?
- Não existe nada.
- Olha que eu vou espalhar…
- Pode espalhar que é mentira.
- Como é que você sabe o que eu vou espalhar?
- Qualquer coisa que você espalhar será mentira.
- Está bem. Vou espalhar.

Mas dali a pouco veio um telefonema.
- Escute. Estive pensando melhor. Não espalha nada sobre nada daquilo.
- Aquilo o quê?
- Você sabe.

Passou a ser temido e respeitado. Volta e meia alguém se aproximava dele e sussurrava:
- Você contou para alguém?
- Ainda não.
- Puxa. Obrigado.

Com o tempo, ganhou uma reputação. Era de confiança. Um dia, foi procurado por um amigo com uma oferta de emprego. O salário era enorme.
- Por que eu? – quis saber.
- A posição é de muita responsabilidade – disse o amigo. – Recomendei você.
- Por quê?
- Pela sua descrição.

Subiu na vida. Dele se dizia que sabia tudo sobre todos, mas nunca abria a boca para falar de ninguém. Além de bem-informado, um gentleman. Até que recebeu um telefonema. Uma voz misteriosa que disse:
- Sei de tudo.
- Co- como?
- Sei de tudo.
- Tudo o quê?
- Você sabe.

Resolveu desaparecer. Mudou-se de cidade. Os amigos estranharam o seu desaparecimento repentino. Investigara. O que ele estaria tramando? Finalmente foi descoberto numa praia remota. Os vizinhos contam que a voz que uma noite vieram muitos carros e cercaram a casa. Várias pessoas entraram na casa. Ouviram-se gritos. Os vizinhos contam que mais se ouvia era a dele, gritando:
- Era brincadeira! Era brincadeira!

Foi descoberto de manhã, assassinado. O crime nunca foi desvendado. Mas as pessoas que o conheciam não têm dúvidas sobre o motivo.

Sabia demais.

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