Hoje, mais do que em outras épocas, se exige do educador uma postura alicerçada num processo permanente de reflexão que leve a resultados inovadores no trato da educação. Sem dúvida, as contribuições de Paulo Freire levam o educador à consciência de si enquanto ser histórico que continuamente se educa num movimento dialético no mundo que o cerca. Não é, pois, por acaso que as ideias freireanas se articulam com os interesses na formação do educador, pois não se perde de vista o caráter histórico do homem associado sempre à prática social.
Paulo Freire, Pernambuco, nascido em 1921, no Recife, contribuiu como poucos na reflexão do homem e seu compromisso com a sociedade. Este movimento de ser homem é pensado no seu percurso reflexivo que permite ser objetivado na medida em que é passível chegar aos espaços de formação de educadores, quer na formação inicial, quer na formação em serviço, a fim de torná-los capazes de transformações necessárias às práticas educativas e pedagógicas.
Nesse sentido, as ideias freireanas servem como orientação para o processo de formação docente no que se refere à reflexão crítica da prática pedagógica que implica em saber dialogar e escutar, que supõe o respeito pelo saber do educando e reconhece a identidade cultural do outro.
Educação problematizadora x educação bancária
Freire não se limitou a analisar como são a educação e a pedagogia, mas mostra uma teoria de como elas devem ser compreendidas teoricamente e como se deve agir através de uma educação denominada libertadora. Para ele, educação é um encontro entre interlocutores, que procuram no ato de conhecer a significação da realidade e na práxis o poder da transformação.
Entende-se por pedagogia em Freire a ação que pode e deve ser muito mais que um processo de treinamento ou domesticação; um processo que nasce da observação e da reflexão e culmina na ação transformadora.
Paulo Freire desnuda a concepção bancária de educação. É uma crítica à educação que existe no sistema capitalista, alicerçada nos princípios de dominação, de domesticação e alienação, transferidas do educador para o aluno através do conhecimento dado, imposto, alienado.
Em uma das suas principais obras, Pedagogia do Oprimido (1983), Paulo Freire discute essa concepção: em que o educador é o que educa; os educandos, os que são educados; o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem; o educador é o que pensa; os educandos, os pensados; o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente; o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados; o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele; o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.
Este desnudamento serve de premissa para visualizar o poder do educador sobre o educando e como consequência à possibilidade de formar sujeitos ativos, críticos e não domesticados. Como se vê, a opressão é o cerne da concepção bancária. Para analisar esta concepção que se fundamenta no antidiálogo, Freire (1983) apresenta características que servem à opressão. São elas: a conquista, a divisão, a manipulação e a invasão cultural.
O “método Paulo Freire”
Apesar da insistência com que se fala, às vezes, nessa história do chamadométodo Paulo Freire, eu tenho a impressão, talvez um pouco imodéstia agora, que se trata muito mais do que de uma certa compreensão geral da educação, de uma maneira de praticar educação do que de um método. A questão vai além do método (Freire, 1979). Paulo Freire era um pensador, bem além de seu tempo e como tal não se limitava a métodos. Para ele a educação estava além dos métodos e antes e acima de tudo era um ato político. Para ele o dado fundamental de todas as coisas do mundo é o diálogo. O método é secundário. O diálogo para ele é o sentimento do amor tornado ação.
O que Freire propõe é uma compreensão geral acerca da educação, da maneira de se praticar a educação. Esta compreensão, é claro, tem a ver com prática e esta prática tem a ver com um método. O método está contido nesta compreensão geral acerca da educação. Mas o que Freire nos propõe está muito além do método, está nos questionamentos acerca da própria educação, que para ele está na e fora da escola, da forma que hoje esta se coloca para os educandos onde quer que estes estejam. Por se referenciar também na fenomenologia, Freire está sempre em busca do conhecer, do mergulho empático na cotidianeidade do educando como fator essencial na construção do currículo.
A pedagogia do diálogo e o ato de liberdade
Paulo Freire sempre esteve à frente de seu tempo e, apesar de se referenciar no marxismo e na fenomenologia existencial, ele não se limita essas concepções, elas não funcionam como uma camisa de força para este educador visionário. Criando um pensamento pedagógico único e totalmente original, suas ideias se espalharam pelo mundo através de seus escritos. Ele não separava a educação e a política. Para ele a educação é um ato político: “a leitura da palavra deve ser inserida na compreensão da transformação do mundo” (Freire, 1989), ou seja, ao se viabilizar a leitura da palavra, o educador estaria ao mesmo tempo levando o educando a ler o mundo. E isto para ele é um ato político, pois está ligado a mudanças políticas e sociais.
Paulo Freire acredita que o dado fundamental das relações de todas as coisas no mundo é o diálogo. O diálogo é o sentimento de amor tornado ação, o diálogo amoroso, que é o encontro dos homens que se amam e que desejam transformar o mundo.
Segundo Freire, o diálogo não é só uma qualidade do modo humano de existir e agir. O diálogo é a condição desse modo, é o que torna humano o homem. O relacionamento professor-aluno precisa estar pautado no diálogo, ambos se considerando sujeitos no ato do conhecimento, numa relação horizontal. O autoritarismo tradicional que permeava a relação da educação tradicional precisa ser banido para dar lugar à pedagogia do diálogo. Contudo esta relação horizontal não acontece de forma imposta. Ela ocorre naturalmente quando educando e educador conseguem se colocar na posição do outro, tendo a consciência de que, ao mesmo tempo, são educandos e educadores.
Na pedagogia do diálogo insere-se também o conceito de educação para Freire, onde ninguém sabe tudo e ninguém é inteiramente ignorante. A educação não pode ser diminuidora da pessoa humana. Ela precisa levar à redenção. Por isso uma educação que reprime não é a que redime. Para Freire nós nos educamos em comunidade. Sua busca era por uma educação comprometida com os problemas da comunidade, o local onde se efetiva a “vida do povo”. A comunidade para ele é o ponto de partida e de chegada.
Portanto a Educação é um processo permanente. Ela não se esgota nos minutos de cada aula, não se prende aos muros escolares, exatamente porque não acontece exclusivamente na escola. Segundo Freire, nos educamos a vida inteira. Até o momento da morte para ele se constitui num ato educativo.
Márcio Balbino Cavalcanteprofessor, geógrafo e mestrando em Geografia.
Bibliografia:
· FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 17.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
____________. Pedagogia do Oprimido. 13.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
Fonte: http://www.mundojovem.com.br/artigos/paulo-freire-e-a-reinvencao-do-ato-educativo
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