Por Daiana Stolf, da Vida Simples
Fonte: Planeta Sustentável
Você é uma criança. Mora ao lado da escola, em uma casa feita de bambu. De manhã, acorda com os passarinhos e caminha até o campus. Alguns passos e já enxerga a ponte, também de bambu, que a leva até o jardim; o verde das árvores, vistoso, toma conta dos olhos. Você faz um carinho no filhote de cabra, dá bom-dia aos outros animais, passa pela lagoa de aquicultura e segue o caminho de pedras até o campo de educação física, a primeira aula do dia.Terminados os exercícios, você caminha para a aula de música. Daqui a pouco tem recesso. Meia hora depois, chega o momento de ir para a sala de aula. Ela não tem paredes. Você se senta na cadeira e puxa a mesa, ambas de bambu, para continuar o dia de aprendizados. Olha para frente e enxerga o quadro branco feito a partir de para-brisa de carro. É hora de aprender bahasa, a língua local, seguida de matemática e inglês.
O tempo passa rápido e você nem nota que já está na hora de almoçar. Vai até a cantina e se delicia com os pratos – os vegetais são plantados ali atrás, na horta orgânica de que você ajuda a cuidar. Ainda pensa se quer experimentar se tornar vegetariano, vai discutir a questão com sua professora mais tarde. Ops, uma e quinze, corre para a aula de empreendedorismo. Ah, não se esqueça também de preparar o material para o projeto da comunidade ali perto, no qual você ajuda a plantar um campo de arroz.
No fim da tarde, seus colegas de escola se reúnem em uma grande poça de lama. E assim você termina o dia: correndo, brincando e se esbaldando na lama – sem se preocupar se sua mãe vai ficar brava com toda aquela sujeira. Ela parece gostar de ver você se divertindo.
A história acima não é fruto da minha imaginação. Faz parte da rotina dos 330 estudantes de 50 nacionalidades e seis continentes da Green School, localizada na cidade de Ubud, na ilha de Bali, Indonésia, em um terreno de 16 hectares no meio da floresta. Em 2012, foi considerada a escola mais verde do planeta – e não é à toa.
O foco da escola é a sustentabilidade, começando pela estrutura: os banheiros têm um sistema de compostagem; o bambu, material local, é largamente usado como matéria-prima; os alunos aprendem a cultivar o jardim orgânico e a cuidar dos animais. Até o momento, 80% da escola funciona com energia solar, com planos de atingir 100% em alguns meses, e a construção valoriza a luz natural – os raios do Sol entram por entre as frestas do bambu
ESCOLA ORGÂNICA
Idealizada em 2006 pelo casal John e Cynthia Hardy, a Green School começou a funcionar oficialmente em setembro de 2008, com 90 alunos. Ele canadense, ela americana, ambos se encantaram com as ideias do educador Alan Wagstaff, que já havia arquitetado uma learning neighborhood (“comunidade de aprendizado”, em português) no documento Three Springs.
Alan sonhava com uma vila onde a escola fosse o centro de atividades educacionais, sociais e comerciais. O foco recairia inteiramente sobre os estudantes, e quatro premissas fundamentais formariam a base educacional: capacidades físicas (o que ele chamou de kq), emocionais (eq), intelectuais (iq) e sinestésicas (sq). Ele também idealizou uma comunidade participativa, integrada e desenvolvida ao redor da escola – que seria também utilizada para festivais e eventos culturais.
Com a Green School, a visão de Wagstaff se tornou realidade. O currículo é bem diferente, apesar de todos aprenderem as disciplinas acadêmicas básicas, como matemática, inglês e bahasa, a tal língua local. Há, por exemplo, aulas temáticas nas quais meninos e meninas são desafiados a desenvolver as capacidades citadas ao lado (físicas, emocionais, intelectuais e sinestésicas). E todos aprendem, ainda, metodologias de cooperação e são apresentados à teoria de inteligências múltiplas do pesquisadorHoward Gardner, renomado psicólogo de Harvard.
Por fim – e para atrelar a teoria à prática -, os estudantes, constantemente, analisam casos de empresas reais e são estimulados a se envolverem em projetos práticos na escola e na comunidade. Nas turmas do ensino médio, por exemplo, os estudantes têm a aula empresa verde, na qual são instigados a elaborar uma ideia para criar seu próprio empreendimento sustentável.
Além disso, a instituição é totalmente integrada à comunidade que a rodeia: tanto o café como o restaurante da escola são geridos pelos pais dos estudantes e o lucro, revertido para bolsas de estudo que possibilitam o engajamento de alunos locais, que constituem cerca de 10% do corpo estudantil. À medida que a primeira turma do colegial se prepara para entrar na universidade – a formatura ocorre em junho -, desenha-se a questão: será que uma educação diferente é capaz de formar cidadãos conscientes, preocupados com suas ações no mundo e em como mudá-lo para melhor? Que caminhos seguirão?
O educador Paulo Freire gostava de dizer que a escola deveria ensinar o aluno a “ler o mundo”, a “conhecer a realidade”, para então conseguir transformá-la. O que se vê na Green School é exatamente isso: um lugar sem paredes, que não delimita fronteiras e que ajuda seus alunos a despertarem o que têm de melhor.
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